domingo, 12 de fevereiro de 2012

Por todas, Ana...

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                Quando dei por mim estava no mustang conversível 1964 que meu avô tinha me deixado de herança, cruzando a ponte a aproximadamente 120 km/h e ela estava ao meu lado. A pele dela era branca, muito branca mesmo, o cabelo dela cacheava antes de chegar ao fim e tinha umas partes mais loiras que as outras e ele brilhava quando o sol batia nele. Ela tinha um sorriso lindo, não perfeito, mas era lindo. E ela brincava com a mão para o lado de fora, guiava o vento, para cima e para baixo. Os olhos em tom de mel eram mais perfeitos que qualquer azul ou verde desses por ai. Era um bonito dia de sol. As pernas estavam esticadas sobre o painel do carro e deixando a mostra a tatuagem na panturrilha. Deus abençoe as meninas bonitas com tatuagens. O nome Ana parecia pequeno para o tanto que ela mostrava ser. Mas não imagino nenhum nome melhor. O rádio estava ligado, mas eu não conseguia ouvi-lo.
                - como eu amo Chico Buarque. Ela disse. sem olhar para mim, não tirava os olhos do mar e aumentou o volume e realmente estava tocando Chico Buarque. Parece que toda mulher admira o jeito do Chico Buarque, mas ter um cara assim seria difícil demais para qualquer uma, homens assim choram. Elas precisam de frieza. Não interprete como machismo.
Realmente Chico Buarque merece todo meu respeito.
                - Para aonde nós vamos Ana?
                - O motorista é você Thomas. Ela me olhou depois de muito tempo e sorriu. Às vezes ela vinha perto me cheirava e elogiava meu perfume, outras vezes me mordia no ombro e voltava a sorrir e brincava com o vento. Eu provavelmente a amava. Mas sabia que ela iria embora cedo ou tarde. Sabia dos meus limites.
                - Para de ser inseguro, não combina com você. Ela às vezes podia ler meus pensamentos, pelo menos era o que parecia.
                - Vamos para praia ver o sol se pôr.
                - Ainda pegaremos 2 horas de sol.
                - Isso te incomoda? Reduzi a velocidade.
                - Mudaria seus planos por mim?
                - Não vejo porque não.
                - Esse jeito de poeta. Ele riu e foi um pouco mais carinhosa.
                - Sabe que odeio que você me chame assim. Belisquei sua coxa, em pouco tempo ficou marcada. Ela ainda sorria.
                Chegamos à praia, não havia muita gente. A cidade não recebe muitos turistas em outubro, então a praia ficava com os surfistas locais e alguns “ripeis”, não sei se gostava de chamá-los assim. Eles gostavam de ser chamados assim. Mas não faziam nada além de fumar maconha e tocar violão. E isso não é ser ripie. Ela esticou uma toalha preta na areia e sentou de maneira que eu poderia sentar ao seu lado. Arrumei duas bebidas para gente e me sentei ao lado dela. Nos beijamos por um tempo e depois ficamos rindo dos tombos dos surfistas na água e dos chapados revolucionários na areia. Eu resolvi entrar na água, não é muito a minha, mas estava realmente quente naquele dia e eu precisava me refrescar.  Furei algumas ondas, desviei de algumas pranchas e encontrei uma profundidade confortável e fiquei por um tempo. De vez em quando eu atrapalhava um surfista em uma onda com potencial de ser perfeita e acabei ouvindo algumas ofensas. Um chegou a ser mais agressivo, mas ele ia querer arrumar uma briga embaixo d’água?  Devia ser um revolucionário. Fui um pouco mais pro fundo e em um momento raro a água ficou calma, sem nenhuma onda, deixei as orelhas mergulhadas a ponto de não ouvir nada, além do estranho barulho que o silêncio faz. E por mais que eu tente descrever como estava, não definirá a beleza do momento. Meus pés não alcançavam o chão e passava uma corrente fria neles, os raios de sol atravessava algumas nuvens que passavam a sua frente naquele momento, conseguia ver a Ana sentada na areia, provavelmente lendo alguma coisa, o pessoal com o violão rindo e dançando, uma criança caçando algumas pequenas conchas na areia molhada e sorrindo a cada pequena descoberta nova e o olhar da mãe, que eu podia imaginar, carregando uma emoção linda. Guardei aquela imagem na memória e resolvi voltar para areia.
                Ana realmente estava lendo, era um livro de contos, uma seleção de contos preferidos de um jornalista que ela adorava, eu realmente esqueci o nome dele. Estiquei outra toalha e me deitei e estava quase pegando no sono. Aquele sono que a praia causa.
                - Você é tão cheiroso. Depois mordeu minha orelha.
                - Eu acho que te amo. Ela sorriu.
                - Eu também acho. Mordeu mais forte. Você está salgado... e cheiroso.
                - Quando você vai embora?
                - Terei que ir embora hoje. Ela se deitou ao meu lado.
                - Eu vou com você
                - Me prometeu que não diria isso.
                - Mas eu te amo Ana, mais do qualquer pessoa poderia amar.
                - Como você sabe disso?... Você ama demais Thomas
                - Eu só sei, prefiro levar a vida assim, com amor.
                - Nada é pra sempre Thomas, você verá
                - O amor é sim. Os nossos rostos estavam quase colados
                - Você é poeta.
                Ela me beijou e nossos rostos, enfim, estavam colados. O jeito dela de poucas palavras, vários sorrisos, elogios precisos e um desejo no olhar que comovia qualquer um, fazia com que a esperança de um amor eterno renascesse em cada um, mesmo ela própria não acreditando no amor eterno. Nos beijamos e nos amamos até o sol começar a se pôr, ela tirou uma foto nossa com o meu celular e a colocou como papel de parede. Disse que momentos assim se eternizam em nossas memórias e essa parte, esse momento, mesmo curto, seria eterno pela intensidade de cada detalhe, pelos sorrisos que nasceram nele e por cada coisa que aprendemos a sentir. Ela era confusa, mas parecia confiante no que dizia. Talvez acreditasse em sonhos como qualquer um, mas depois de sofrer com algo, escolheu ignorar os seus desejos. Recolhemos nossas coisas e fomos para o carro, haviam deixado um bilhete informando que queriam comprar o carro e anotaram o telefone caso a possibilidade de venda me tentasse e esse tipo de coisa era comum. Amassei o bilhete, liguei o carro e fomos embora. Ela pediu para deixá-la na rodoviária. Percebi que estava chegando a hora de dizer adeus, fui um pouco mais devagar, tentando adiar uma inevitável dor. Era dramaticamente e um pouco exagerado o meu sentimento, mas aquilo estava me consumindo de tal forma, que perdia o ar às vezes, às vezes cambaleava na direção. Ela havia percebido, quando podia me dava a mão, bagunçava meu cabelo com um bom cafuné. Quando chegamos à rodoviária, uma amiga dela estava em frente com as coisas dela e antes de sair do carro ela me deu o melhor de todos os beijos. O melhor para o fim. Clichê.
                - Acho que vou te amar Thomas. Cheirou meu pescoço, abriu a porta e foi embora, sem olhar para trás, sumiu entre pessoas e malas. Liguei o carro e fui embora. Parei em uma loja de conveniência, comprei algo forte para beber e fui até a praia. Me sentei mais ou menos onde estávamos  sentados mais cedo e esperei até o choro chegar. Ele não veio. Tudo que ela me disse e fez me causou um bem tão grande, não havia porque chorar ou provavelmente era muitos motivos para chorar e não sabia por onde começar. Algo assim. Não sei por quanto tempo vivemos algo, mas poderia nunca ter tido fim. E depois de um tempo de bebidas e lembranças reparei a lua, estava linda e enorme. Meu celular apitou, havia recebido uma mensagem. “Você estava tão cheiroso.” Pensei em ligar, mas era de um número restrito e não lembrava se ela tinha deixado um número de celular. Dediquei um brinde a ela.
                - Por todas, Ana...