2. Carta para Ana
3. Minha ressaca Ana
Eu chegava
em casa mais uma vez com um machucado na cabeça, uma dor no estomago e uma jura
de morte. Estava amanhecendo e a geladeira estava aberta e pelo cheiro algo
estava estragado dentro dela. Fechei a porta da geladeira, não antes de pegar
uma garrafa de uísque que mal encheu metade de um copo. O sol invadia a sala
por entre a persiana torta que cobria metade de uma janela pequena e que não se
abria por completo, deixando a casa sempre um pouco mais abafada do que a rua.
Sentei na poltrona e fiquei olhando para a TV, pensando seriamente se queria me
ligar com o mundo e todas as merdas que andam acontecendo nele. Na minha
humilde vida de abandonado, a vida já estava ruim. Imagina compartilhar dores
de guerras e problemas de corrupção. O meu extremo egoísmo, digno de solidão. O
telefone tocou e esperei até o terceiro toque para ver se realmente queriam
falar comigo.
- pronto...
- você está bêbado ou de ressaca?
- um pouco dos dois.
- preciso conversar com você Thomas...
- deixarei a porta aberta...
- estarei dormindo brother, minha cabeça está me
matando.
- Levarei café.
Vitor era um bom amigo. Ele que sempre tentava me
tirar da fossa com saídas para festas e reuniões com antigos amigos. Assumo que
pouco me esforcei para tentar conquistar alguma alegria daquelas festas, não
compartilhava muitos sorrisos sinceros. No começo só bebia e fumava alguns
cigarros, amargurando e ficando mais cinza a cada dia. Depois fui cedendo e me
alegrando, conseguindo sorrir sinceramente. Normalmente com antigas histórias
na época que todos estudavam juntos. Adormeci depois de uns 15 minutos de um
mundo girando e espirros por causa poeira. Tive um sonho estranho, fazia tempo
que não sonhava. Fazia tempo que não dormia. Apenas desmaiava. Eu estava no meu
carro levando uma menina que não era a Ana, mas era a Ana. Sabe aqueles sonhos
que você sonha com uma pessoa, mas a pessoa do sonho não é a pessoa, mas no
sonho, você sabe que é a pessoa?! Confuso, espero que tenha entendido. Estava eu
e a Ana diferente, nós dois sorriamos e eu acelerava o carro de acordo com a
música, ela segurava minha mão, parecia me amar a cada quilometro e eu me
sentia o dono do mundo. Eu não tirava os olhos da estrada, e acelerava cada vez
mais. Ela se aproximava do meu ouvido e me chamava de poeta e quando reparei a
imagem da Ana era realmente ela. Suas tatuagens, sua pele branca, seu sorriso,
seu perfume. Então eu comecei a chorar e a cada lágrima meu sorriso se
alargava. Então ela me pedia um beijo e se aproximava um caminhão surgia na
nossa frente. Ela não gritava. Sorria e me beijava. Eu ouvia uma desesperada e
constante buzina. Acelerava cada vez mais e no momento da batida eu acordei.
Suado e com Vitor olhando para minha cara rindo de mim.
- Está rindo de que?
- estou feliz, você sorria dormindo. Escondi minha
felicidade com isso.
- tem açúcar? Tentei ignorar o meu sorriso.
- não o suficiente pra você, tome o banho e me dê a
chave do carro vamos dar uma volta.
- tudo bem, mas eu dirijo... boa tentativa.
Tomei um banho e pelo visto o chuveiro estava ruim, a
água gelada suspendia minha respiração em alguns momentos e o silêncio parecia
me avisar algo, era uma estranha paz. Entramos no carro e acabei o deixando
dirigir no meu lugar. Ajudou com a minha dor de cabeça e relaxava com o vento e
com as pernas no painel. Era um dia de sol, mas estava frio, usava minha melhor
jaqueta e meu arranhado óculos escuros. Estava em paz. Chegamos à praia, bem
aonde jogava minhas garrafas com poesias.
- tome uma garrafa, uma folha e sua caneta, escreva
algo quem sabe ela não recebe?
- você me
tira de casa para me jogar no poço? Não estava acreditando que ele estava
fazendo aquilo, me senti mal. Ele já havia me acordado algumas vezes naquele
mesmo lugar, com as roupas molhadas, carteira vazia e alguns hematomas. Estava com
tanta raiva que decidi descer, não podia ficar ao lado dele. Cheguei ao local de
costume, perto de uma pedra de mais ou menos quinze metros que metade ficava na
areia e metade na água. Bebi o que restava da garrafa, nada além da metade
dela. Depois escrevi.
“eu te odeio Ana.
Odeio meus sonhos.
Odeio suas lembranças.
Odeio o sorriso que surge,
quando me lembro de você.
Odeio nossa longa história
e esse enredo de novela.
Odeio o longo tempo
para o fim dela.”
- Se eu soubesse que me odiava tanto, não teria
voltado. A voz dela entrou pelo meu ouvido e foi me arrepiando. Pescoço, peito,
braço, pernas, costela e por fim lágrimas. Enrolei a poesia e pus na garrafa. Criei
coragem tirei os óculos e olhei para trás. Como em um sonho confuso o sol a
embaçava. Ela abaixou e a podia ver, me beijou a testa, enxugou minhas lágrimas
e sorriu devagar. Passou a mão em minha barba.
- Ana eu...
- só me beije Thomas... Então fechei os olhos. e aos
poucos o mundo foi sumindo. e não podia ouvir nada. era um banho frio. Era o
acordar de um pesadelo ou um recomeço de um sonho.
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