quinta-feira, 11 de abril de 2013

Um sorriso em dor



               
                Eles olham para trás e lá estava eu, estranhando minha própria sombra, por ainda achar que estava à noite e perguntam se estou bem
                -  está tudo bem com você?
                Eu digo que sim e ignoro seus olhares tortos e a ajuda dos que considero mais amigos, em minha testa arde um arranhão e depois de levantar percebi que meu olho esquerdo não estava aberto. Devia estar um pouco bêbado. Eu ainda estava bêbado. Então o amigo mais próximo perguntam se ainda valia a pena toda aquela dor. Já não sabia da dor que ele queria dizer, então forcei abrir os olhos para poder olhá-lo e ofender de uma forma melhor que apenas um dedo. Eu não me lembrava muito bem o que havia acontecido.
               
                - você se meteu em uma briga, estava com a mulher de um cara, três vezes do seu tamanho.
               
Eu gosto de brigar. Eu sei lutar.
                Bom sempre que acordava depois de uma briga, era isso que eu tinha como certeza. Mas todos negavam. Todos incluindo meu rosto. Então fui para casa. E no caminho as pessoas continuavam a me olhar. Uns tinham pena. Alguns tinham nojo. Eu era só um rosto após um atropelamento. Nada demais. Nada mais parecia estar no lugar que estavam ontem. Alcancei meu quarteirão e um homem que por acaso me conhecia me ajudou a subir as escadas. Era meu vizinho. Era meu vizinho da porta da frente, não era minha culpa, era culpa do olho fechado e do caminhão com pernas que passou por cima dele.
               
                - você foi atropelado?
               
                Não fui atropelado, fui atrás do que eu queria. Queria um pouco de uma nova dor. Nunca tinha ficado com o olho daquela forma. Fui atrás e consegui o que eu queria. Já estava sozinho em meu apartamento. Eu estava de frente ao espelho. Ali parado, com o olho no tamanho de uma bola de basebol, consegui sorrir. Meus dentes estavam vermelhos e o gosto de sangue me causava mau hálito. Tirei o sorriso do rosto, mas a imagem refletida continuava sorrindo, como se o espelho tivesse tirado uma foto e moldurado em tamanho real. Depois de alguns rápidos segundos a imagem refletida voltou a se movimentar. Mas não me acompanhava e olhava pra frente como se eu não a atrapalhasse. Uma janela. Então o meu reflexo se curva e aproxima o olho do tamanho de uma bola de basebol, de mim e começa a arrancar a pele dele como uma espécie de curativo, ele rir, como se fosse uma nova dor. Então começa a sangrar. Ele continua tirando a pele. Até não haver mais nada. Ele para endireita a coluna. Agora a imagem me acompanha no que eu faço. Então reparei que no lugar do olho do reflexo havia um buraco que não parecia ter fim. Então me curvo. O reflexo também se curva. Olho bem nos olhos então tudo ao redor de mim é sugado pelo olhar do meu reflexo. O cenário muda consigo me ver no bar, tropeçando nos outros com um copo de qualquer coisa na mão. Então agarro uma mulher e a beijo. Ela parecia estar gostando, então aparece o caminhão humano. E me acerta alguns socos. Eu sorria. Sorria de felicidade. Como se procurasse a dor. Como se procurasse a fenda dos meus olhos. Cai desacordado. Ninguém me levanta. Então tento me ajudar. Mas algo como um vidro me prende. Posso andar para os lados. Então vou para direita. Passo por uma espécie de parede e logo depois pude ver o bar novamente, na frente havia um espelho e eu me vejo nele. E me vejo em outro espelho, e depois em uma parte laminada da porta. Estou preso em um espelho. Reparo nos meus olhos e lá estava a venda. O caminhão me chuta enquanto estou desacordado. Sinto a dor mesmo estando dentro de um espelho. Então fecho os olhos e algo em meu peito queima e depois de alguns minutos ou horas. Sinto um alivio enorme algo como colocar os pés na água do mar após percorrer alguns longos metros de areia quente. Em mim prevalecia a vontade de sorrir. Tudo estava preto demais. A dor era enorme. Eu sorria. Procurava uma dor diferente. Procurei um fim.

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